Vou-me pôr... volto amanhã!

Quinta do Canal. Figueira da Foz. 2007

Dormias até tarde, como se tivesses medo de começar o dia. Aproveitava o teu regaço, aconchegava-me e gostava de esperar o despertar. Tudo era familiar... o ranger reumatóide da cama, a persiana que aprisionava a escuridão, os vinco na pele que já quase se fundira com o lençol e até o bolorento hálito da noite. Abro a persiana, a pele sebosa e luzidia ainda está impregnada de sono. Levantas-te como se não estivesse ali, há sempre algo mais urgente do que eu... gosto de abrir os braços e ficar assim, a sentir o calor da cama a desaparecer, como se a noite se extinguisse lentamente após uma morte anunciada. Voltas... gosto de te ver vestir logo pela manhã!  Gosto de  observar a paciência que tens a escolher a roupa que enfias no corpo, como te demoras a decidir a melhor combinação de trapos, nem que seja só para escolher entre uma camisola de pijama côr-de-rosa ou um robe às riscas... Sais novamente, tens mais que fazer e eu sou uma perca de tempo adicional a todos os preciosos minutos que já te demoraste a meu lado... tens fome! Sigo o teu rasto e encontro-te na sala a saciar a fome... coço a barriga! Arrasto os pés lentamente pela casa, como quem quer apagar o teu rasto... gosto do cheiro das  minhas virilhas! Volto para a cama, sinto falta de ser eu... Vou-me pôr e volto amanhã!

Fausto Bordalo Dias - Foi por Ela